Melissa Almeida: Crítica de Fim de Semana no Paraíso Selvagem

Melissa Almeida, do Arte como Lar, será uma das críticas da edição 46 do Festival Guarnicê de Cinema. Ela produzirá as resenhas dos seis longas nacionais que compõem a programação. Aqui, ela avalia o filme “Fim de Semana no Paraíso Selvagem”, de Severino, em exibição hoje (11) no Teatro João do Vale (Rua da Estrela, 283) às 19h45. A obra também ficará disponível de modo virtual a partir das 17h30 até às 18h de segunda (12).

Melissa Almeida

O Festival Guarnicê de Cinema

Quarto mais longevo festival de cinema do país, o Guarnicê celebra o audiovisual maranhense e nacional há 46 anos. Promovido pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (Proec) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), o festival ocorre entre os dias 09 e 16 de junho. O Guarnicê tem patrocínio da Equatorial Energia, Museu da Memória Audiovisual do Maranhão(MAVAM) e do Governo Federal por meio do Banco do Nordeste.

Conta também com o apoio da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão (ALEMA), Fundação Sousândrade, Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), Eduplay, Secretaria de Estado da Educação (SEDUC), Centro Cultural do Ministério Público, TV UFMA, Rádio Universidade, Secretaria Municipal de Educação (SEMED), SESC, Associação Maranhense de Desenvolvedores de Jogos, Bulldog, Gráfica A5, Mar Doce, Teatro João do Vale e Teatro Arthur Azevedo.

Confira a crítica:

“Segundo longa do diretor pernambucano Severino, Fim de semana no paraíso Selvagem nos insere na trama de Rejane (Ana Flavia Cavalcanti), uma mulher que volta à sua cidade natal, um pequeno vilarejo distante, depois da morte supostamente acidental do irmão. Somos apresentados a um lugar que apresenta um contraste na sua paisagem, se dividindo entre um cenário industrial, onde há transporte de cargas, e as pequenas estradas de terra do vilarejo. Rejane se descobre em um local onde o poder se concentra nas mãos de pequenas famílias ricas, conservadoras e violentas que controlam tudo que acontece na pequena cidade. À medida que ela investiga e desvenda algumas verdades,  se torna alvo de ameaças.

É difícil não ver a influência do cinema de Kleber Mendonça Filho, se tratando da invisibilidade de pequenas comunidades distantes e da luta entre indivíduos em posições de poder e aqueles que são subjugados ou sofrem opressão, como em Aquarius (2016) e  Bacurau (2019). Na sua primeira noite no vilarejo, depois de se assustar com uma espécie de gambá, Rejane é visitada interrogada na casa do seu irmão por Maristela, uma personagem que inicialmente se apresenta como acolhedora, mas ali conseguimos ver a forma de controle de quem chega e de quem deixa – de uma forma ou de outra – a pequena cidade. Não apenas pela abordagem de Maristela, mas pela forma como a fotografia do filme permite que a vejamos, contribuindo para identificarmos a sua intenção. 

Muito do impacto de uma imagem vem do uso da iluminação. No cinema, a luz é mais do que aquilo que nos faz enxergar, e aqui um destaque para o uso dela em alguns momentos do filme. Durante a abordagem a Rejane, Maristela é iluminada com uma lanterna de baixo para cima, que tende a distorcer características. Nesse contexto, essa iluminação funciona para criar efeitos de terror dramático, deixando-a com uma aparência assustadora. Em outros momentos, é iluminada com uma luz lateral, deixando a outra parte do rosto sem luz, indicando talvez a obscuridade que carrega consigo. 

Iluminação cria efeito de terror dramático em Fim de semana no paraíso selvagem (2020)

Alguns acontecimentos intensificam o mistério, que vai aumentando ao longo da narrativa: um corpo encontrado na praia, o mistério em volta da morte do irmão de Rejane, e o assassinato da sua mãe anos atrás, que se relaciona com disputas territoriais e moradia para os menos privilegiados. A presença da especulação imobiliária, também como nos filmes de Kleber Mendonça Filho, parece ser o principal motivo do mal disso tudo. Os poderosos buscam expulsar os pescadores para dar lugar a um empreendimento chamado Novo Paraíso. A frase dita por um personagem parece traduzir a situação que os moradores do vilarejo se encontram: “resolvido tá pro grande, pro pequeno a corda arrebenta”. 

A especulação imobiliária é um tema crucial que precisa ser discutido e compreendido. O cinema, em suas narrativas e representações visuais, tem o poder de nos fazer refletir sobre as consequências desse fenômeno em nossas cidades e comunidades. Ao mesmo tempo que somos confrontados com questões de desigualdade, o filme nos convida a pensar nas consequências sociais, econômicas e ambientais dessa prática.

O filme não entrega todas as respostas que precisamos para se envolver de forma mais íntima com os personagens e com a narrativa. A escolha de não revelar tudo para criar um certo mistério é válida, mas na medida certa. A falta de elementos cativantes não desperta o interesse no desfecho, deixando um pouco a desejar. Contudo, nos faz refletir sobre temáticas sociais importantes. ”

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