Por Paulo Vinícius Coelho*
Brasília, Gramado, Vassouras, Tiradentes, Rio de Janeiro e São Paulo são alguns exemplos de cidades que servem de inspiração para nomear importantes festivais de cinema do Brasil. No mundo inteiro, aliás, os festivais costumam fazer referência aos locais onde surgiram. Isto, mais do que uma demonstração de afeto, é uma forma de posicionamento em defesa do cinema produzido regionalmente.
Apesar do avanço das plataformas de streaming e da circulação maior de filmes nesse cenário, os festivais ainda preservam a sua função de difundir obras que estão distantes do circuito comercial e que abordam outros olhares, perspectivas “não mercadológicas”.
A edição 2022 do Festival Guarnicê de Cinema, por exemplo, premiou como melhor longa-metragem nacional o acreano “Noites Alienígenas’’, de Sérgio de Carvalho, obra fundamental que se passa em Rio Branco e discute a violência, o avanço das facções criminosas e o destino dos jovens das periferias.
Agora disponível na Netflix, o filme não chegou às salas comerciais do Maranhão. No restante do país, ficou “espremido” entre as grandes produções da Marvel, DC ou outras companhias gigantescas, como acontece com praticamente todos os filmes nacionais.
Exibir em nosso estado obras que talvez não chegassem aqui por outro caminho é uma das virtudes que torna o Guarnicê imprescindível. Por outro lado, a sociedade maranhense precisa reivindicar outros espaços de exibição. O Centro Cultural Odylo Costa Filho, que abriga o Teatro Alcione Nazaré, a Escola de Dança Lilah Lisboa e o Cine Praia Grande – único cinema público de São Luís – está fechado para uma “reforma eterna”. Deveria ter sido reinaugurado há três anos. Oficialmente, nada é informado.
Outro grande atributo do Guarnicê é ressaltado pela ausência. Como não há curso superior em cinema no Maranhão, o festival ocupa o papel de protagonista no fomento do mercado audiovisual. Em todas as edições, dezenas de ações formativas que incluem oficinas, minicursos e palestras são promovidas. É comum ouvir realizadores maranhenses afirmando a função determinante do Guarnicê em suas carreiras.
Contudo, se escrevo, é porque considero que o Maranhão e São Luís precisam aprofundar a sua relação com o festival, seguindo o exemplo das cidades citadas no começo. Isso não significa, é claro, que os problemas ou as ausências do Guarnicê devem ser ignoradas.
De todo modo, é preciso sempre ter em norte a relevância cultural, econômica, turística e política do festival, ainda mais se considerado que estamos em um mercado cinematográfico afastado dos grandes centros comerciais, com menos recursos disponíveis, poucas salas de cinema e ainda sofrendo os efeitos da pandemia.
É nesse cenário que o festival que leva a sua origem tatuada no nome – Guarnicê faz referência ao momento de preparação dos grupos de bumba meu boi – é realizado (há 46 anos!).
Por isso, retomo a tese do título: São Luís e o Maranhão precisam abraçar o seu festival de cinema. Se não pelo reconhecimento da longevidade, tradição e legado, que seja por uma boa dose de bairrismo! Pela coragem de organizar com tanta resiliência e determinação um dos festivais de cinema mais importantes do país, pela alegria de fazermos o festival em junho, no meio do São João maranhense, e pelo orgulho de fazer um festival que se expande a cada ano, ainda mais agora em formato híbrido, mas que continua sendo o nosso festival.
*Paulo Vinicius Coelho é assessor de comunicação da Diretoria de Assuntos Culturais da UFMA. Participa desde 2020 da equipe de produção e comunicação do Festival Guarnicê de Cinema. Coordenou a comunicação das últimas três edições do evento.